O problema do ataque do Cruzeiro não é a qualidade da finalização
Número isolados fazem pouco sentido
Hoje mais cedo compartilhei no X (aka antigo Twitter) um mapa com todas as finalizações do Cruzeiro até aqui no Campeonato Brasileiro:
* percentual de gols em relação às finalizações no alvo.
É uma visualização bonita, que ajuda a ter uma noção de onde costuma sair os gols do time, mas nada muito além disso. Com a ajuda de alguns seguidores, fomos “abrindo” por jogadores e aí sim conseguimos algo um pouco mais informativo. Por exemplo, o Barreal deixando claro duas de suas virtudes: chutes de média distância e entradas na área pela diagonal:
No meio das interações, algumas pessoas acharam muito baixo o aproveitamento geral do Cruzeiro. 292 finalizações para para marcar 31 gols? Parece pouco, não?
Vamos ver.
Já há algum tempo eu postei uma thread argumentando que o problema do ataque não era a qualidade da finalização, mas a criação de boas chances de gol. Nesse post, vou atualizar e aprofundar um pouco mais nos dados.
Os Dados
Primeiramente, o que significa 37% de finalizações no alvo e, dessas, 29% serem gols?
Bem, significa que o Cruzeiro é 4º time que mais acerta o gol, proporcionalmente. Significa também que o é o 9º time em gols por finalização certa:
Em número absolutos, o Cruzeiro é apenas o 12º em finalizações, mas o 6º em gols marcados. Ou seja, as finalizações não devem ser tão ruins assim.
Gols Esperados - xG
Saindo de número de finalização e olhando pela ótica de gols esperados, temos ainda mais alguns bons pontos.
Para quem não está acostumado, o xG nada mais é do que a probabilidade de gol no momento da finalização dado a posição no campo, parte do corpo, posicionamento dos adversários, etc. Ou seja, um xG baixo indica baixa probabilidade de marcar e, portanto, uma chance não tão clara de gol.
Comparando gols com gols esperados, o gráfico abaixo mostra como o Cruzeiro é o sexto melhor ataque apesar de ser um dos times que menos cria gols esperados:
Ou seja, marcamos bem mais do que se esperaria. Mas por quê? Então o tal do xG não vale nada, certo?
Não é bem assim.
Veja bem, a todas as váriáveis envolvidas no cálculo do xG são apenas alguns dos fatores que ajudam ou não a marcar um gol. Falta um importante fator: a qualidade da finalização em si. Imagine um jogador sem ângulo, com três zagueiros encima e finalizando com a perna ruim. A probabilidade dele marcar (xG) é baixa: a chance não é clara. Mas mesmo assim, nada impede dele acertar um chute forte no ângulo e marcar.
Aqui trazemos outra medida, o gol esperado após a finalização ou xGoT (sigla em inglês para Expected Goals on Target). o xGoT nada mais é que a probabilidade de gol quando a bola chega no gol dado a posição dela, do goleiro, a força do chute, etc. Dessa forma, mesmo uma finalização com baixa probabilidade de gol pode ter um alta probabilidade quando a bola chega no gol e isso é puro mérito do finalizador.
Assim, naquele cenário imaginário, digamos que o xG seria de 0.05. Apenas 5% de chance de marcar. Mas com o chute muito forte no ângulo, tivemos um xGoT de 0.90, ou seja, 90% de chances de gol após o chute. A diferença desses dois 0.9 - 0.05 = 0.85 é então a probabilidade de gol adicionada pelo finalizador. Essa sim uma boa métrica para avaliar finalizadores.
Pois bem, o Cruzeiro tem apenas 23.34 xG no Brasileirão, sendo o 4º pior time. Ao mesmo tempo é o 8º time com maior xGoT, 32.78.
São 9.4 gols esperados a mais após a finalização em comparação com o momento da finalização. Simplesmente o 2º time nesse quesito:
Considerando os 31 gols reais, são mais de 7 gols acima do esperado, o melhor time do campeonato:
Ou seja, apesar de criarmos muito pouco, a qualidade da finalização adicionou quase 8 gols a mais para o Cruzeiro até aqui.
Olhando a nível de jogador, o gráfico abaixo trás no eixo X o xG acumulado e no eixo Y a diferença acumulada entre xGoT e xG. Ou seja, quanto mais a direita, mais frequentes e mais claras são as chances de finalizar e quanto mais acima, mais probabilidade de gol é adicionada pelo jogador.
Note que a maioria dos principais jogadores de ataque adiciona boa probabilidade de gol após o chute. Destaque para Matheus Pereira e Gabriel Veron.
Olhando assim, com Veron e Pereira bem no canto superior direito até pode parecer que criamos boas chances para eles, mas vejamos os demais times:
Olhando em perspectiva os jogadores do Cruzeiro ficam ofuscados na imagem, deixando claro como nossos principais finalizadores não tem nem de longe chances tão boas para finalizar quanto poderiam.
Para encerrar, temos a evolução dos gols, gols esperados e gols esperados após a finalização ao longo das 292 finalizações do Cruzeiro no campeonato:
O número isolado de 37% finalizações no alvo pode parecer pouco, mas o espaço entre as linhas azul e vermelha acima deixa claro que o problema não está em colocar a bola para dentro, mas sim colocar a bola em melhores condições para finalizar as jogadas.